O Espaço Cultural das Marias no bairro do Ibura, em Recife, foi interditado pelo poder público porque estava sem alvará de funcionamento. Pra quem não sabe o espaço é um Quilombo Urbano de iniciativa de três mulheres negras de terreiro que apoia e incentiva manifestações afro-brasileiras como coco, afoxé, samba e maracatu
A vizinhança hostiliza o espaço por ser frequentado por sapatonas, frangos e travas, pelas gestoras serem lésbicas, bissexuais e pelo local acolher eventos de protagonismo lgbtq+. o bar ainda sofre acusação de ser um antro de usuários de drogas apenas por ser um espaço de sociabilidade e acolhimento da juventude dissidente periférica.
Este rechaço e preconceito é movido por três vizinhos que agem para expulsá-las da rua alegando que existe consumo e a venda de drogas, brigas e orgias, ameaçando levar as meninas que gestionam o espaço e o dono do imóvel ao ministério público.
Se por um lado o Estado age de forma racista impondo uma regularização higienista e elitista, através da obtenção de um alvará para quem está, de forma autônoma, tentando sobreviver como herdeiras de um passado que excluiu os direitos básicos de moradia, acesso a terra e alimentação da população negra, este caso revela que quando as vítimas não colaboram com o cistema heterossexista, a população sexodissidente é jogada a uma total situação de precariedade econômica, vulnerabilidade social e impedida de se expressar culturalmente. Quando falamos de cisheterossexualidade enquanto regime político é porque entendemos, entre outras coisas, que o campo do trabalho privilegia pessoas alinhadas com a cisgeneridade e heteronorma, ou seja, o “proletariado”, como um sujeito revolucionário, marginaliza quem não se encaixa no modelo de trabalhador cisheterossexual.
Desta forma, a Monstruosas tenta mobilizar sua rede de solidariedade para apoiar e fortalecer estas manas negras que vivenciam a dissidência sexual e são retaliadas pela hegemonia racista e cisheterossexista. Para além da crise, está é uma ação que exige uma redistribuição financeira como forma de trazer, dignidade, autonomia e proteção para pessoas negras que estão experimentando e vivendo além dos gêneros e da sexualidade que lhe são atribuídas. O apoio pode ser feito através de deposito na Caixa Econômica Federal em nome de Jéssica Priscilla Torres Lopes Ag: 0047 / Op: 013 / Conta Popupança: 91985-1 / Cpf: 098.222.644-61 ou através desta vakinha.
Abaixo o apelo das meninas em suas próprias palavras.
queria ser o mais cética possível, mas é bem difícil numa situação dessa.
então, em conjunto, decidimos que o melhor a se fazer agora é fechar o espaço. essa semana entramos num acordo com o dono do ponto e decidimos que daríamos uma parte do aluguel essa semana e a outra parte até semana que vem. mas entendemos que a vizinhança está realmente com o propósito de nos tirar de lá e que qualquer documento que a gente faça pra continuar trabalhando não vai ser o suficiente, então não ta valendo a pena o desgaste psicológico, físico e financeiro por um lugar onde não nos querem lá. um lugar racista, lgbtfóbico e machista. além disso, todos os trâmites sairia muito caro e já temos muita demanda, muitas coisas pra pagar. na quarta fizemos o “dia das namoradas, nas marias” lá no casarão (conseguimos por uma junção de gente muito foda que se organizou pra nos ajudar e fazer com que esse nosso rolê desse certo. uma delas foi o gabinete das deputadas das juntas e mais algumas pessoas individuais incríveis também) e o dinheiro que conseguimos lá, pagamos o ponto, exatos $500 reais (pra segurar e pagar o outro pedaço na semana que vem). mas ainda falta o depósito onde pegamos as nossas bebidas que tá no valor de $1.400 reais (por conta dessas duas semanas que não podemos trabalhar), mais nossa casa de $450 reais, mais uma dívida no total de $1500 reais, aproximadamente, de coisas que compramos para a melhoria do espaço e que precisamos pagar a galera. a questão é que precisamos pagar a essa galera e recomeçar tudo.
temos consciência de que fizemos tudo muito certinho e que aquele espaço era nosso. um espaço de pretas e pretos. um espaço LGBT. um espaço da nossa família. mas é muito difícil resistir quando se existem pessoas extremamente racistas e lgbtfóbicos que são extremamente “fortes” pra sociedade a ponto de inventar mentiras pra autoridades e conseguir o que querem.
acreditamos que conseguimos mostrar pra todos nossa pretensão. não era um bar, mas um espaço cultural de mulheres pretas, mães, lgbts e candomblecistas que estavam de braços abertos pra acolher quem são os nossos, pra levar nossa cultura pra comunidade, pra movimentar os comércios já existentes e ajudar na criação de outros, de divulgar os artistas do nosso ibura, de acolher, ajudar, trocar e trazer junto com vocês o que é nosso pra nós. a gente sabe que chegamos muito perto disso com a revolta de algumas pessoas.
o intuito da gente, hoje, é conseguir esse dinheiro pra pagar tudo e tirar o resto pra alugar uma casinha maior e montar um espetinho.
a gente realmente precisa de vocês. com doações, com abraços, com a troca.
então falem com a gente, vamos pensar em algo juntxs pra que a gente consiga nos encontrar o mais rápido possível num lugar que realmente seja nosso. mais fortes.